Muito se discute acerca do que as empresas devem fazer quando os empregados se recusarem a usar máscaras, álcool em gel ou outras medidas preventivas impostas na tentativa de combater a disseminação do novo coronavírus, mas já pararam para pensar o que pode acontecer se as empresas não fornecerem essa garantia mínima de segurança aos respectivos trabalhadores?
Essa discussão ganhou ainda mais destaque com o julgamento de recurso ordinário realizado pela 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2° Região, que atende São Paulo e Região Metropolitana, nos autos da reclamação trabalhista de n. 1000960-84.2020.5.02.0606, já que foi mantida a condenação de uma empresa de transporte público ao pagamento de verbas rescisórias oriundas de rescisão contratual pela sua própria justa causa.
Isso mesmo, não é só o empregado que pode ter o contrato de trabalho extinto por justa causa em caso de descumprimento das orientações mínimas de prevenção e combate à disseminação da COVID-19, as empresas também podem ser consideradas culpadas pela rescisão contratual, especialmente quando o trabalhador alega que não foram disponibilizadas as condições necessárias para o desempenho do trabalho na modalidade presencial.
No caso em questão, o trabalhador, que era cobrador de ônibus, acionou a Justiça do Trabalho com o objetivo de ter o contrato de trabalho dado por encerrado, diante da exigência de retorno ao trabalho feito pela empregadora, ainda que durante os efeitos mais drásticos da pandemia, sem o fornecimento de equipamentos de proteção ao contágio, uma vez que não eram disponibilizadas máscaras, álcool em gel e outros materiais para a garantia da sua higiene pessoal.
A empresa, em sua defesa, alegou que, apesar de o trabalhador executar as atividades laborais de grande exposição ao público, não pertencia ao grupo de risco e que, inclusive, havia o registro de fornecimento de máscara e álcool. Porém, nos documentos que instruíram a defesa, não houve a juntada de documentos que comprovassem as referidas alegações.
Assim, tanto a sentença dada pelo juiz de origem, quanto a acordão que reviu este posicionamento inicial, entenderam que o fato de o trabalhador exercer atividades de trabalho presencialmente e exposto ao contato com muitas pessoas ao longo da sua jornada diária, bem como diante do não fornecimento de equipamentos de proteção individual adequados para a garantia de segurança, são motivos mais do que suficientes para se encerrar o contrato de trabalho por justa causa do empregador.
Com o avanço da vacinação no Brasil, temos percebido que diversas empresas e escritórios ou já voltaram para a modalidade presencial de trabalho ou implementaram o modelo híbrido, que é aquele em que o empregado deve comparecer nas dependências físicas do empregador em alguns dias da semana e em outros o trabalho ocorre de forma remota.
Diante dessa situação, é interessante que as empresas, antes mesmo de efetivarem o retorno do trabalho presencial pelos empregados, ainda que de maneira híbrida, se certifiquem se todas as medidas de segurança necessárias para a garantia de um ambiente de trabalho saudável, que respeite não só as regras de distanciamento social, como também a necessidade de fornecimento de condições adequadas para o exercício das atividades laborais de forma segura.
É claro que as condições e materiais que deverão ser respeitadas e fornecidas pelos empregadores vão depender do tipo de segmento da empresa, da efetiva exposição e vulnerabilidade dos trabalhadores quando da execução das atividades presenciais. Entretanto, alguns itens, ainda que com a integralidade dos trabalhadores presenciais já completamente vacinados, deverão ser fornecidos e até mesmo fiscalizados quanto à efetiva utilização pelas empresas.
Tal necessidade ainda permanece, mesmo com a vacinação já adiantada no País, uma vez que, os casos de contágio, desenvolvimento de sintomas mais graves e até mesmo morte, permanecem com número expressivo não só no Brasil, como no mundo. Infelizmente, a pandemia ainda não está controlada e todo o cuidado é pouco para a garantia de um ambiente de trabalho minimamente saudável aos trabalhadores. As empresas que não seguirem essa conduta preventiva, certamente, poderão sofrer com penalidades decorrentes de fiscalizações do Ministério do Trabalho, bem como com condenações judiciais contrárias aos seus próprios interesses que trarão ainda mais prejuízos de ordem financeira e até mesmo de imagem.