No agronegócio, onde operações envolvem altos valores e risco de crédito, não é incomum que devedores tentem “blindar” seus bens da execução por meio de estratégias questionáveis. Transferências de imóveis para filhos, doações para ex-cônjuges logo após um divórcio suspeito ou a criação de empresas em nome de parentes são algumas das manobras utilizadas por produtores endividados para evitar a satisfação de seus credores.
A recente decisão do STJ relativiza a Súmula 375, que prevê que o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. No novo entendimento, a mera existência de um processo de execução e a alienação do bem a familiares diretos já podem ser suficientes para caracterizar fraude, ainda que não haja penhora registrada.
No caso que motivou esse novo entendimento, um devedor, ao perceber a iminência de uma execução, transferiu um imóvel para o próprio filho. Alegou que a transação era legítima, pois não havia penhora sobre o bem no momento da venda. No entanto, o STJ entendeu que o simples fato de haver uma execução em curso e a alienação do bem para um familiar direto demonstravam um indício claro de fraude, pois a intenção era frustrar a satisfação do crédito.
Isso representa um avanço na proteção dos credores, que frequentemente se deparam com situações em que devedores esvaziam seu patrimônio antes que a penhora seja formalizada, tornando mais difícil a recuperação do crédito.
No setor agro, esse tipo de manobra é recorrente. Alguns exemplos práticos incluem:
Divórcio Simulado: Produtores rurais com dívidas elevadas realizam divórcios estratégicos e transferem bens para o ex-cônjuge em um acordo de partilha artificial, mantendo a convivência normalmente. Quando o credor tenta executar, o patrimônio já está fora do alcance.
Venda ou Doação para Filhos e Parentes Próximos: Imóveis, equipamentos agrícolas e até rebanhos são transferidos para herdeiros para dificultar a ação doscredores.
Criação de Empresas de Fachada: O devedor abre uma empresa agrícola emnome de familiares e transfere os bens para ela, continuando a explorar os ativos sem que eles estejam formalmente em seu nome.
A relativização da Súmula 375 fortalece o combate a essas práticas, pois permite que o credor obtenha a nulidade da transação sem precisar, necessariamente, do registro da penhora, bastando demonstrar que a alienação foi feita em contexto fraudulento.
Como Credores Podem se Proteger?
Monitoramento Patrimonial: Acompanhar movimentações patrimoniais dos devedores pode revelar indícios de fraude antes da concessão de crédito ou da instauração de uma execução.
Ações de Indisponibilidade: Mesmo antes da penhora, credores podem pedir medidas judiciais que impeçam a transferência de bens suspeitos.
Uso Estratégico da Jurisprudência: A decisão do STJ fortalece pedidos de nulidade de transações patrimoniais fraudulentas e deve ser utilizada de forma proativa pelos credores. Este é passo importante para garantir a efetividade da recuperação de crédito no agronegócio, um setor onde a concessão de garantias reais é essencial para viabilizar financiamentos e negócios.