A Corte Especial do STJ, em julgamento de Embargos de Divergência, determinou, excepcionalmente, a possibilidade de penhora de parte do salário do devedor para o pagamento de dívida não alimentar, desde que preenchido o requisito de preservação do valor digno que assegure a subsistência do devedor e de sua família, independentemente do montante de seu salário.
Trata-se, na origem, de ação de execução para a cobrança de aproximadamente R$ 110.000,00 (cento e dez mil reais), com base em cheques emitidos pelo executado.
Os referidos Embargos de Divergência foram interpostos contra acórdão proferido pela Quarta Turma do STJ, a qual tinha delimitado entendimento acerca da possibilidade de penhora de salário nas seguintes hipóteses:
- Pagamento de prestação alimentícia de qualquer origem, independentemente do valor salarial recebido; e
- Pagamento de qualquer outra dívida (não alimentar), desde que os valores salariais superassem 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais.
Dessa forma, considerando que não houve o preenchimento de um dos requisitos destacados acima, fora mantido o indeferimento do pedido de penhora de 30% (trinta por cento) do salário do executado.
Inconformado com o acórdão, o credor apontou em seu recurso precedentes da Corte Especial e da Terceira Turma do STJ, as quais entendem que para afastar a impenhorabilidade das verbas de natureza salarial, deve-se demonstrar que a penhora de percentual sobre o salário do devedor não irá prejudicar a sua subsistência, independentemente da natureza da dívida e do quanto o devedor aufere mensalmente.
Segundo o entendimento do Ministro João Otávio de Noronha, suprida a palavra “absolutamente” do caput do artigo 833 do CPC, a impenhorabilidade se torna relativa, “permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade”.
Assevera, ainda, que “a fixação desse limite de 50 (cinquenta) salários-mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família”.
Sendo assim, para o requerimento da penhora de percentual do salário do devedor o credor deve ter o cuidado de respeitar a ordem de constrições elencadas no artigo 845 do CPC, ou seja, deve esgotar todas as tentativas de constrição.
Portanto, a interpretação dada pela Corte Espacial do STJ em relação à relativização da impenhorabilidade de percentual de salário do devedor é de vital importância para as ações que buscam a recuperação de crédito, pois garante a possibilidade de constrição de salário do devedor dentro da realidade brasileira, se comparado com a interpretação da penhora de percentual apenas caso o devedor auferisse mais de 50 (cinquenta) salários-mínimos. Ao mesmo tempo, cria-se uma barreira para que o devedor possa manter o seu sustento e de sua família sem lhe causar prejuízos acentuados, garantindo assim, a sua dignidade.