Como vimos, dentre as principais inovações trazidas pelo PLV 15/2022, Marco Legal da Securitização, merece destaque a conceituação de forma clara acerca do que é securitização, companhia securitizadora, bem como a festejada amplitude do certificado de recebível (CR).
Seguindo a ideia da Resolução CVM 60, publicada no final de 2021, este diploma legal unifica as regras aplicáveis a todos os instrumentos de securitização financeira. Nesse sentido, foi revogado o art. 40 da Lei 11076/2004, o qual previa o conceito de securitização de direitos creditórios do agronegócio.
Em palavras simples, securitização nada mais é do que a operação em que temos de um lado empresas que pretendem antecipar o pagamento de seus recebíveis (direitos creditórios com vencimento futuro), e, de outro, investidores dispostos a realizar este pagamento antecipado, mediante remuneração.
Assim, a securitização é uma das formas de financiamento através do mercado de capitais, no qual há um fluxo direto entre a empresa deficitária e o investidor/poupador, não havendo a intermediação de uma instituição financeira.
Contudo, não é possível o estabelecimento desta linha direta entre a empresa tomadora do crédito e o investidor, posto que existem fatores de riscos nas operações, sendo, portanto, essencial a proteção dos investidores.
Nesse sentido, atuando como agente regulador a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), estabelece regras de acesso e de transparência, bem como normas de proteção ao investidor.
Neste cenário, surge a figura da companhia securitizadora, responsável por fazer a “ponte” entre a empresa deficitária e o investidor, estando sujeita a todas as normativas da CVM.
Constituídas sob a forma de sociedade por ações (SAs), as securitizadoras são responsáveis por adquir direitos creditórios e fazer a emissão de títulos para serem ofertados aos investidores no mercado de capitais.
Cumpre destacar que a securitizadora responde somente pela origem e autenticidade dos direitos creditórios vinculados ao título por ela emitido, cujo valor não poderá ser superior ao valor total dos direitos que servem de lastro mais outros ativos vinculados (garantias adicionais).
Como dito acima, existem regras de acesso ao mercado de capitais, de forma que as companhias securitizadoras devem ser registradas na CVM, mediante o cumprimento de diversos requisitos, expressamente dispostos na já citada Resolução CVM 60. A partir daí, fica permitido à securitizadora a emissão pública de títulos representativos de operações de securitização, quais sejam, certificado de recebíveis (CRs) e debêntures financeiras, a depender da categoria que se enquadre.
Antes do Marco Legal da Securitização, somente os setores do agronegócio e imobiliário que podiam se valer da securitização, através dos respectivos títulos: Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), e Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI).
De forma a atender os anseios de outros mercados, foi criado o CR, hábil a fomentar os mais diversos setores, apontando especialistas que educação e saúde poderão ser grandes beneficiários.
O CR é um título de crédito, cujas características explicamos abaixo:
– título de crédito nominativo: emitido em nome de beneficiário determinado;
– emitido de forma escritural: destinado a custódia em instituições autorizadas pela CVM ou Bacen, de forma que toda a movimentação do título é rastreada em sistema eletrônico de registros;
– de livre negociação: o emitente é livre para elaborar o conteúdo do título, desde que presentes todos os requisitos legais, previsto no art. 21 do Marco Legal da Securitização.
Ademais, semelhante ao CRA e CRI, o CR é emitido exclusivamente por companhia securitizadora, constitui promessa de pagamento e é título executivo extrajudicial.
O art. 19 do Marco Legal da Securitização ainda traz no conceito do CR a possibilidade de dação em pagamento, o que trataremos com maiores detalhes na próxima Pílula.
Faz-se notar, portanto, que foi ampliada a aplicação da securitização, sendo possível a emissão de CR, mas também, englobando recebíveis de outros tipos de valores mobiliários, desde que originados do respectivo setor econômico.
Tendo em vista que o setor que nos interessa é o agronegócio, traçando um paralelo com o CRA, sua emissão é condicionada a existência de lastro em direitos creditórios originados no setor do agronegócio.
Nesse sentido, o §1º do artigo 23 da Lei nº 11.076/2004, alterado pela “Nova Lei do Agro” conceitua o que pode ser considerado como direito creditório, devendo, obrigatoriamente, ter relação com a produção, a comercialização, o beneficiamento ou a industrialização de produtos ou insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na atividade agropecuária.
Ademais, quando da estruturação de operação de CRA, cautela fundamental é a obtenção de evidências quanto à negociação junto aos produtores rurais ou suas cooperativas, hábeis a fundamentar o financiamento pleiteado. Como exemplo de documentação possível a este quesito temos: pedidos de compra, contratos de compra e venda e outros, em que o produtor ou cooperativa sejam parte.
Portanto serão lastros possíveis de CRA: a Cédula de Produto Rural Financeira– CPRF; o Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio – CDCA; o Warrant Agropecuário – WA; a Nota de Crédito à Exportação – NCE; a Cédula de Crédito à Exportação – CCE; Debêntures ou Notas Promissórias; bem como outros recebíveis originados na cadeia produtiva (comercialização de insumos, serviços de logística, parcerias, arrendamentos, etc).
Conclui-se que a clareza dos conceitos trazidos pelo Marco Legal da Securitização, bem como a criação do CR, traz maior segurança jurídica, eficácia e dinamismo ao mercado de capitais, podendo auxiliar no desenvolvimento de diversos setores econômicos no país.