Todos sabem que quando falamos de vínculo de emprego, estamos tratando de empregados, pessoas físicas e, portanto, detentores de direitos e garantias fundamentais, tais como: dignidade humana, intimidade, privacidade, etc. Assim, sempre teremos dados pessoais de pessoas físicas sendo tratados pelos empregadores desde o início do processo seletivo até, muitas vezes, o término das respectivas rescisões contratuais, já que a legislação pode exigir a retenção de documentos por determinado período.
Com isso, é bem claro que um dos setores empresariais que mais foi atingido pela Lei Geral de Proteção de Dados no Brasil (LGPD) foi o de Recursos Humanos, uma vez que é este o departamento responsável pela gestão, ainda que indireta, pelos processos de seleção, efetivação da contratação, concessão de benefício, bem como disponibilização dos dados pessoais dos empregados até mesmo para as demais áreas da empresa.
É uma missão difícil, mas é de extrema importância que as empresas, especialmente através de seus departamentos de recursos humanos, estabeleçam critérios bem definidos para a utilização dos dados pessoais dos empregados pelos demais departamentos da empresa, como pode ser o caso do comercial, marketing etc.
Perguntas relacionadas à extensão das possibilidades de utilização dos dados pessoais fornecidos pelos empregados para possibilitar a execução do contrato de trabalho são extremamente comuns. Por exemplo, tais dados já fornecidos pelo empregado podem ser utilizados, sem consentimento expresso específico, para fins comerciais, de marketing ou outros?
E dessa pergunta, muitas outras surgem, não é mesmo? E se o empregado fornecer o consentimento durante o contrato de trabalho para a utilização do telefone pessoal para fins diversos e específicos da execução do contrato de trabalho, pode a empresa continuar usando este número após a rescisão do contrato de trabalho?
Para exemplificar bem a problemática trazida acima, é interessante citar uma recente decisão emitida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, que condenou uma empresa varejista de chocolate ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 nos autos da reclamação trabalhista de nº 0010337-16.2020.5.03.0074, sob o fundamento de que houve a utilização indevida de telefone celular pessoal de ex trabalhadora em sítio eletrônico da empresa.
Ao se analisar os autos, verifica-se que a referida empregada não colheu qualquer tipo de consentimento prévio e específico da trabalhadora para a utilização do telefone celular no respectivo sítio eletrônico, se valendo apenas do contrato de trabalho firmado com ela. O telefone era utilizado, então, para a comercialização dos produtos vendidos pelo estabelecimento.
O acórdão, inclusive, ressalta que, apesar de o número do telefone celular não indicar diretamente a titularidade da trabalhadora, uma simples ligação feita por um cliente faria com que houvesse o contato direto com a titular dos dados pessoais e não com o estabelecimento comercial, o que, por si só, configura ato ilícito e, consequentemente, indenização por danos morais.
O que podemos tirar dessa decisão?
Os dados pessoais de empregados coletados quando do processo seletivo e formalização e execução do contrato de trabalho somente poderão ser utilizados pelo empregador para finalidades relacionadas a essas questões, a saber: elaboração de contrato de trabalho, aditivos contratuais, concessão de vale-transporte, plano de saúde, plano odontológico, dentre outros benefícios etc., e, portanto, a utilização para qualquer outro fim somente deverá ser realizada com o enquadramento em outra base legal, como por exemplo, o consentimento expresso e específico acerca das finalidades e tempo de duração.